A propósito do sumiço de 5,7 biliões de dólares no “Caso Sobrinho/BESA”, uma observação assaz pertinente, publicada em primeira mão no estrangeiro e “postada” no Facebook sobre o que se passou nestes últimos quatro ou cinco anos no Banco Espírito Santo Angola, chama a atenção do leitor o volume do dinheiro sacado nesse banco por “Quem de direito”.
Por Fernando Barão
Q uanto dinheiro cabe numa mala? “Numa mala de executivo cabe um milhãozito em notas de cem dólares, bem apertadinhas. Agora imagine que levantou de um banco 525 milhões. 525 malas, um camião TIR! (pelo que se diz são mais de setecentos milhões o que Sobrinho papou). É de outro mundo? Não, é deste.
Aconteceu em Angola, no BESA, com gestores angolanos e portugueses. Onde está o dinheiro? Uma parte foi depositada em contas de não se sabe quem, a outra em contas do presidente e de um administrador do banco. Chocado? Então continue a ler.
Foi o que fizemos, continuámos a ler, mas antes de entrar no miolo deste golpe magistral, quase mortal para qualquer banco, vamos fazer um pequeno retorno no tempo para melhor entender a situação actual.
No ano de graça de 2009 depois de Jesus Cristo, o Banco Espírito Santo Angola (BESA) foi distinguido com o prémio Banco do Planeta, atribuído pelas Nações Unidas através da Unesco. O seu director executivo desse tempo era um angolano, Álvaro Madaleno Sobrinho, personagem perseguida pelo fisco e Ministério Público de Portugal por ter sido, alegadamente, surpreendido numa tarefa rotineira de lavar dinheiro sujo proveniente, vejam só, de Angola.
Não sei se estão a ver o topo da montanha, estamos em plena crise financeira e económica, ofertada sem juros pela falência do gigantesco banco americano Lehman Brothers, e eis que neste cataclismo monetário uma instituição bancária angolana faz.
A mostra das suas excelentes qualidades de gestão e recebe de mão beijada uma prestigiosa distinção internacional. Palmas na assistência e restante povo, festa entre os accionários, louros para Álvaro Sobrinho, tudo ouro sobre azul, com os juízes portugueses a encolherem-se e, claro está, o brasão desse bancário a brilhar de novo em todo o seu fulgor d’antanho, novinho em folha!
Sobrinho continuou a dirigir o BESA, o homem fez o que quis e o BES de Lisboa deixou fazer. O Sobrinho agradeceu, foi ao cofre e serviu-se, mas só depois – e disso não restam muitas dúvidas -, de ter servido em grande as mais gigantescas “trutas” empresariais, financeiras e políticas do regime JES/MPLA. Tão simples como isso.
Nesta proveitosa passeata ao longo da majestosa auto(mática)-estrada da corrupção angolana, passaram dois anos sem qualquer problema, mas, em 2011, os auditores comanditados por Lisboa repararam que o BESA estava numa situação tão má que só com ajuda exterior poderia escapar a uma fraudulenta bancarrota, o buraco atingia quase seis biliões de dólares e… já agora, adivinhem quem foi ao socorro do BESA… não vale a pena adivinhar, é elementar, foi o Estado angolano, graças à intervenção providencial de JES, que se prestou a assumir e a prestar garantias oficiais sobre estes créditos malparados.
Isto há maneiras de ganhar dinheiro e enriquecer em dois tempos e três movimentos que nem ao Mafarrico passaria pela cabeça! Foram quase 6 mil milhões de dólares (vulgo seis biliões) para os canecos privados. Desapareceram, não se sabe onde estão, eram empréstimos sem nome certo do beneficiário, nem qualquer garantia, uma festa.
Em finais de 2013, depois de uma espécie de revolução palaciana nas altas esferas do Banco Espírito Santo Angola (BESA) a situação por que estava a passar o banco foi explicada aos accionistas pelo novo CEO, Rui Guerra, em duas reuniões que decorreram em Angola, mais precisamente, em Luanda.
O panorama apresentado por Guerra foi descrito em poucas palavras, o que se justifica plenamente, pois é extremamente complicado justificar com alguma lógica o desaparecimento de um valor de 5,7 biliões de dólares de crédito (cinco mil e setecentos milhões de dólares) concedido pelo BESA “a alguém”, o que representa nada menos do que 80% do total da carteira desse estabelecimento bancário. Curiosamente, não há informação sobre quem são os beneficiários económicos nem para que fins foi utilizado o dinheiro. Há muito poucas garantias reais e as que existem não estão avaliadas. Eis pelo essencial a notícia dada pelo semanário português Expresso.
Sabendo nós que em 2009 o BES Angola chegou a ser distinguido com o prémio Banco do Planeta, atribuído pelas Nações Unidas através da Unesco, não vale a pena argumentar, para justificar o que se passou, recorrendo a noções como desleixo, distracção, negligência, não, o acto foi cirúrgico e magistralmente executado durante vários anos. Os que comeram do mesmo bolo não devem ser poucos! E todos eles, são, com certeza, membros da mais ufana “High Society”de Angola.
As reacções a esta bomba mediática não se fizeram esperar. O semanário Expresso, revelador do “caso”, escreveu: «Na história de empréstimos sem registos nem garantias do Banco Espírito Santo Angola (BESA), “não há inocentes”, “só culpados”, numa clara alusão ao bradar aos Céus de João Vieira Pereira, director adjunto do BES em Portugal, “como é que em pleno século XXI é possível que um banco atribua créditos de quase 6 mil milhões de dólares sem saber em concreto quem beneficiava desses empréstimos? Nesta história não há inocentes, só culpados”, garantiu, para em seguida acrescentar, “porque se o empresário Álvaro Sobrinho é o rosto das operações”, havia um conselho de administração que “é co-responsável”, uma empresa encarregue da auditoria, a KPMG, que nada disse, e um regulador, o Banco Nacional de Angola, que nada fez”.
Todos no mesmo saco: Culpados. O BNA também? Sim, também…
Pedro Santos Guerreiro, o director executivo do Expresso, por seu lado, num artigo de opinião que subscreveu, descortina o que se passou: “Paremos para pensar na loucura de tudo isto. Um homem fez o que quis, o BES de Lisboa deixou fazer, os auditores só repararam em 2011. Nessa altura, o BESA estava numa situação tão má que foi necessário o Estado angolano, graças a JES, avançar com uma garantia sobre estes créditos”. E rematou, “Mas alguém vai perder muito dinheiro. Os accionistas, claro. Mas é provável que também o Estado de Angola perca».
Façamos aqui uma pausa. Neste passo da história levantam-se questões interessantes:
– Que interesses levaram JES a acordar uma garantia de Estado de um montante tão elevado ao BESA, empresa privada?
– Que teria perdido o Estado angolano com o descaminho definitivo desses biliões do BESA?
– Que elos unem tão estreitamente JES ao BESA?
– Será o Estado angolano/JES, sócio do BESA pela calada?…
A partir deste ponto, a nossa e qualquer outra análise entrarão, como barco à vela, num mar de espesso nevoeiro, sem vento nem correntio e, de velas pandas não vai dar para poder navegar, vamos sim derivar, especular, imaginar o óbvio, como foi possível esse óbvio acontecer, pondo sistematicamente de lado, por termos medo dos jacarés, a única hipótese válida: trata-se de um roubo evidente com mais que provavelmente, inteira e entusiástica cumplicidade directa das mais altas esferas do Estado angolano.
Álvaro Madaleno Sobrinho é um homem tumultuoso e polémico. Acusado em Portugal de fuga e branqueamento de capital, não tendo actividade económica em Angola capaz de justificar os grandiosos investimentos que ia fazendo, vai de si que, antes desta descoberta do mega buraco do BESA, não era preciso apresentar provas de que este homem não podia ser o financiador das compras que as suas sociedades faziam e pretendiam fazer (comprar a RTP, por exemplo), pois ele trabalhava em empresas de terceiros, logo não podia ter outro dinheiro que não fosse o que lhe era pago em emolumentos.
Contudo, como ele trabalhava no BESA e este, em Angola, é conhecido como sendo testa de ferro do sector bancário com capitais do MPLA em Portugal, não é preciso ser bruxo para adivinhar que ele e seus parentes, esses cavalheiros da família Madaleno, são laranjas do principal accionista do banco em Angola, o MPLA (ver mais adiante), ou então são da presidêcia da Republica, pois os Madalenos ou “Sobrinhos” não têm actividade em empresas de comunicação social em Angola, apenas compraram jornais para silenciar vozes discordantes.
A actual gerência do BESA pensa que neste imbróglio, Sobrinho teria abocanhado mais de setecentos milhões, o que acrescido às suas anteriores operações financeiras dúbias, explica o facto de ele estar ligado por um porta-moedas bilionário às empresas Newshold, Pineview Overseas e Akoya, isto para não ir mais longe pois o andor do Santo Kumbú é grande e a procissão comprida… Este homem, como já referimos, é dono do semanário SOL, mas o seu nome nem sequer figura na lista dos dez principais accionários desse periódico. Só que a Newshold, dona desse semanário, é dele. Portanto… por quê esconder?
O primeiro número do Sol, semanário português publicado às sextas-feiras, saiu a 16 de Setembro de 2006, num lançamento em fanfarra, com uma tiragem de 128 mil exemplares. É obra!
Em boa verdade, numa primeira análise nada se pode encontrar nessa compra como sendo motivo para noticiar de modo incisivo. A referida compra parece ter as características duma notíciazeca sem peso na balança de poderes da imprensa escrita, especificamente no mercado de revistas periódicas.
Mas, contrariamente às aparências, nem tanto assim, porque o que nos é revelado vem-se juntar a um fluxo importante de investimentos angolanos no meio de negócios portugueses, nomeadamente nos círculos restritos dos sectores bancário e de imprensa, o que contraria em tudo o que se propaga na mãe pátria desses investidores, Angola, onde desde há uns tempos a esta parte, ao invés de vermos aparecer financiamentos privados a apostar na reconstrução nacional, como continuamente se anuncia na imprensa estatal, tem-se vindo a assinalar um grande acréscimo de interesse dos seus filhos por investimentos fora do país, e particularmente entre aqueles que «se encontram especialmente atraídos pelos arautos do “business” luso.
Vem a propósito aqui, citar um dos últimos lances negociais de Sobrinho a atingir as luzes da ribalta, o da sua proposta de compra da RTP pela Newshold, isto sem esquecer que ele próprio revelou ser também accionista da empresa Pineview Overseas, que é detida (leia-se detentor de poderes delegados por quem de facto é dono) em partes iguais pelos seus familiares Carlos de Oliveira Madaleno, Generosa Alves dos Santos e Silva Madaleno, Álvaro de Oliveira Madaleno Sobrinho, Emanuel Jorge Alves Madaleno e Sílvio Alves Madaleno , sendo este último o presidente da Newshold, dona do SOL e de 15% da Cofina (esta proprietária, entre outros, do Correio da Manhã e do Jornal de Negócios) e 1,7% da Impresa (Expresso e SIC). Um império! Para um empregado de banco, “c’est pas mal”, parabéns.